Acabámos de analisar a proposta de modelo de exercício da soberania e
politica nacional, como a primeira função essencial do Estado, constante do
esquema inserido no artigo nº VII desta série (Modelo de Desenvolvimento de
Economia Social – MODES).
A segunda função essencial do Estado e enunciada no mesmo esquema, diz
respeito ao «Enquadramento Institucional e Jurídico).
Sobre este tema, vale a pena transcrever o texto que publiquei no
blogue, em 04-10-2012, sob o título « O QUARTO PODER DA OLIGARQUIA: A CONSTITUIÇÃO»
« No meu ponto de vista, a
Constituição de 1976, apresenta três grandes e fortes limitações:
1ª – É
demasiado extensa (parece que a mais extensa do mundo), com quase trezentos
artigos e mais do dobro de números e alíneas e é feita de regras rígidas e
extremamente minuciosas, inspiradas numa miscelânea de modelos socialistas do
passado;
2ª- É
blindada quanto à revisão ou alteração de algumas regras, a mais limitativa das
quais, a obrigatoriedade de representação proporcional (de deputados oriundos exclusivamente
de partidos e propostos por partidos) na Assembleia da República;
3ª –
Definição de direitos, liberdades e garantias, com natureza ilimitada ou
absoluta.
Quanto à
primeira limitação, o principal inconveniente é a falta de flexibilidade, ou seja,
as regras são tão rígidas e minuciosas que, qualquer governo corre o risco de,
ao introduzir uma reforma ou inovação em qualquer área da governação ou da
sociedade, por vezes uma simples palavra ou frase, infringir essas regras e a
norma ser considerada inconstitucional.
Esta minúcia
obriga a que, governos do centro ou da direita e por vezes alguns ditos de
esquerda, os que terão maior probabilidade de apresentar propostas governativas
diferentes, tenham de governar à esquerda e portanto segundo o modelo rígido e
minucioso, constitucional.
Podemos
imaginar o que sucederia se o país precisasse de introduzir reformas de fundo,
que implicassem uma alteração profunda das suas estruturas. Ficaria
completamente impossibilitado.
É o que hoje
está a acontecer na grave emergência nacional que estamos a viver.
Estava a
terminar esta reflexão e há poucas horas o sindicato dos magistrados do
Ministério Público anunciava publicamente que as medidas de austeridade eram inconstitucionais.
É a
interpretação jurídica a funcionar, porque na interpretação económica elas, independentemente daquela
interpretação, são acima de tudo erradas pelas consequências
nefastas que irá ter para todos nós e para o país no seu conjunto.
A segunda
limitação, tendo a ver com a proibição de alterar ou rever algumas normas
constitucionais, designadamente o modelo económico de desenvolvimento e a regra
da representação proporcional por lista fechada ( o eleitor vota em partidos e
não em pessoas), utilizando-se o método de Hondt para eleição dos deputados.
Quanto ao
modelo de desenvolvimento, embora a Lei Fundamental não defina a proporção ou
peso de cada sector económico, no sistema proposto de economia mista (privado,
público e cooperativo e social), a verdade é que o sistema económico português
evoluiu para um peso excessivo do Estado (incluindo toda a sua estrutura
orgânica e autárquica, que cresceu de forma desmesurada) e do sector público
empresarial (sectores básicos da economia e empresas autárquicas) que, por via,
da sua gestão danosa e nalguns casos dolosa, originou encargos adicionais
incomportáveis para o Estado.
Paradoxalmente,
a pouca flexibilidade existente nesta área, foi explorada, no pior sentido,
pelos políticos do nosso sistema e explica, em boa parte, o rumo desastroso a
que conduziram o país.
Relativamente
ao sistema de representação proporcional, em lista fechada, a proibição de
rever ou alterar esta norma, impede o aperfeiçoamento do sistema
democrático, para formas mais evoluídas de democracia, favorecendo o jogo
partidário segundo os seus interesses e excluindo a população do processo
de escolha do seus candidatos, isto é, das suas regiões ( são os partidos que
nomeiam os candidatos e muitos nem sequer conhecem as regiões que representam).
Todas estas
limitações têm implicado uma instabilidade política quase permanente, crises
permanentes, conduziu o país à falência e acima de tudo, têm impedido a
realização das reformas de fundo ou estruturais, que seriam inconstitucionais,
mas que teriam aberto caminho a uma rota de crescimento e desenvolvimento do
país, pressupondo, naturalmente, uma governação responsável e competente, o que
infelizmente também não aconteceu em quase quarenta anos desta democracia.
Se
compararmos, apenas aqui na Europa, as constituições dos diversos países, todas
são muito menos extensas e minuciosas do que a nossa e, no caso particular dos
países nórdicos incluindo o Reino Unido, as suas constituições são diminutas e
privilegiando um conjunto de princípios gerais, muito poucas regras e evitando
a minúcia, exactamente para permitir a governação flexível, que permita aos
diferentes governos, aplicar e adaptar os seus programas e implementar as
reformas necessárias, que permitam o progresso dos países.
Em
contraste, os países do sul, têm constituições moderadamente extensas, com mais
regras, mas ainda assim, nada comparáveis à portuguesa, que excede em exagero
todos os recordes a nível mundial, o que é característico de países saídos
de ditaduras e que lidam mal com situações de incerteza.
Quanto à
terceira limitação, a Lei Fundamental, ao definir direitos, liberdades e
garantidas, não impondo qualquer limitação e portanto pressupondo a sua
natureza absoluta e ilimitada, significa que qualquer cidadão, grupo de
cidadãos, organização ou instituição, dentro da sua esfera de acção, poderá
revindicar direitos, realistas ou irrealistas, sem serem ponderadas ou
avaliadas as suas consequências.
Isto
significa que esses direitos têm de ser satisfeitos, haja ou não recursos para
os satisfazer, provoque ou não injustiças sociais, prejudique ou não gravemente
os interesses superiores do país.
Ou seja, não
são comparados os direitos reivindicados, com os prejuízos e as injustiças que
podem causar.
Inúmeros
exemplos poderiam ser dados, ao longo de quase quarenta anos desta democracia
semi-representativa, de abuso e chantagem, proporcionado pela utilização deste
direito constitucional.
O mais
revoltante exemplo, entre outros, podemos encontrá-lo no sector dos transportes
públicos (terrestres e aéreos) em que, greves selvagens e chantagistas,
contribuíram significativamente para a sua ruina, ocasionaram enormes
injustiças sociais e prejudicaram gravemente o país.
A renitência
do nosso sistema partidário, em alterar esta Constituição, lesou gravemente o
país e a maioria da sua população e apenas beneficiou os agentes do sistema, o
grande poder económico, o Estado e minorias privilegiadas colocadas em sectores
económicos estratégicos.
Talvez isto
explique, estou convicto, o fundamentalismo partidário relativamente a esta
Constituição.
No meu
entender, o país só conseguirá trilhar o caminho da estabilidade, da justiça,
do crescimento e do desenvolvimento, depois de vencidos estes quatro gigantes
que têm esmagado o Povo Português:
-A
Constituição, o Sistema Político viciado tal como está concebido, o favoritismo
e excessivo Poder dos Grandes Grupos Económicos e o gigantismo e o excessivo
Poder do Estado.
Só assim,
poderemos abrir caminho a um Novo Sistema Político e a um Novo Modelo de
Desenvolvimento económico e social.
Até lá,
teremos primeiro de arrumar a casa e passar por dias difíceis, pois a pesada
herança deixada pelos políticos ao Povo Português, assim o obriga, com troika
ou sem troika.»
Este excerto, publicado em 04 de Outubro de 2012, remete-nos
necessariamente para a alteração profunda da Constituição, sem abdicar,
naturalmente, dos princípios fundamentais de um Estado de Direito ou,
preferencialmente uma Constituição totalmente nova, adaptada aos tempos,
contexto e geração actuais.
Para tanto é absolutamente necessário, por decisão maioritária de dois
terços dos deputados na Assembleia da República, ser nomeada uma Comissão
Constitucional, integrando constitucionalistas em número proporcional ao peso
das forças partidárias representadas na Assembleia da República, um
constitucionalista oriundo dos partidos não representados e um
independente.
A Comissão
Constitucional, em nome de uma novo paradigma económico, cultural e social,
deve basear-se em princípios e valores que estejam de acordo com o novo modelo,
para o qual se apresenta a seguinte sugestão:
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ORIENTADORES
1-
Reduzido papel
das ideologias, sem as excluir, porque orientadoras da politica mas, pensar antes
em metodologias, formas concretas de resolver os problemas e tenham aplicação
prática efectiva e acima de tudo que estejam ao serviço dos interesses
superiores do país.
2-
Deixar de
pensar em termos de esquerda e direita, termos ambíguos e radicalizantes
e antes passar a pensar em termos de social (o que melhora a vida do
cidadão) e económico (a melhor forma de produzir a riqueza que possa
garantir o social). A estes conceitos, mais realistas e nada ambíguos, temos de
acrescentar os que permitem o efectivo desenvolvimento da sociedade, ou seja o cultural
(formação e educação do indivíduo e a sua afirmação pessoal que lhe permita a
sua ascensão na sociedade), o científico ( desenvolvimento da ciência e
sua aplicação) e o tecnológico (as melhores formas de produzir e de
aplicação da ciência).
3-
Modelo de
Desenvolvimento que rompa com o socialismo estatizante, baseado na exploração da economia privada, verdadeiro sorvedouro dos recursos do país,
bloqueador do crescimento, da afirmação do indivíduo e do desenvolvimento do
país.
4-
Recusa do
sistema de Partidos, como o único fundamento da democracia
5-
Novo
sistema, mais eficaz, de controlo da democracia, a todos os níveis
6-
Garantir uma
maior justiça e racionalidade na distribuição da riqueza, impedindo a grande concentração e a grande
exclusão e envolvendo os cidadãos na criação e planeamento do seu próprio
futuro,
7-
Impedir o
enquistamento, o parasitismo e o
igualitarismo, qualquer que seja o papel dos cidadãos na sociedade. A
mobilidade e ascensão social dos cidadãos e o seu nível de bem-estar social e
económico, têm de basear-se, não na «cunha», na protecção ou na fraude, mas no
seu esforço individual, na sua competência, na sua qualificação e mérito.
8-
Uma nova
concepção do Estado Social baseada,
não numa quase exclusividade paternalista do Estado, mas em novos modelos
inspirados na Moderna Economia Social
9-
Estado
Minimalista, apenas com
a dimensão adequada às necessidades do país, que cumpra a sua função ao serviço
dos cidadãos, libertando-os da sua tutela e predominando a racionalização de
recursos, a eficiência e a eficácia. Com função reguladora e não interventora.
10- Responsabilização civil e criminal dos responsáveis pela administração do país,
a qualquer nível, em caso de gestão dolosa ou danosa dos bens públicos ou
peculato.
11- Princípios de soberania, baseados no modelo
de Democracia Social Participativa.
12- Princípios de organização económica, baseados
no modelo de Economia Social Participativa.
13- Poder executivo e governação do país, baseada
em Planos de Desenvolvimento Estratégicos (PDE´s), a longo e a muito longo prazos, que sirvam de
orientação às políticas e orçamentos anuais, segundo os princípios
constitucionalmente consagrados
14- Nova Constituição flexível, baseada em
princípios gerais e não em regras, mais
pequena no articulado, que consagre os princípios anteriores e institucionalize
o princípio da relatividade dos direitos e das garantias dos cidadãos, em
função dos recursos existentes, da justiça social e do interesse colectivo.