sábado, 21 de janeiro de 2012

OS GRANDES ERROS DA REVOLUÇÃO DE 1974 - CONCLUSÕES (I)

 
Introdução

A quase quarenta anos de distância e tendo em conta a evolução do país nestas quase quatro décadas, já existe suficiente acumulação de factos históricos, experiências, vivências, crises, períodos melhores e períodos piores, que nos permitem obter uma imagem focada da realidade, suficientemente nítida, para entendermos as causas da situação em que hoje nos encontramos.
Um facto é irrefutável:
-  A sucessão de acontecimentos que tiveram origem na Revolução de 1974, terminou numa das maiores crises económica, financeira, política, social, cultural e demográfica, sem precedentes na nossa história dos últimos cento e sessenta anos.
Como protagonista activo destes acontecimentos, desde a primeira hora, embora não tendo participado nas operações militares da Revolução, atento observador dos factos sociais e políticos e tendo em conta a minha experiência enquanto empresário e consultor de empresas durante muitos anos, a opinião que vou formular é pessoal e representa a minha visão dos factos que explicam a situação de catástrofe a que chegámos.
Um país dividido e radicalizado em torno de fundamentalismos político-ideológicos, extremamente desequilibrado nos poderes dos actores sociais, políticos e económicos e o mais atrasado economicamente  da zona euro e dos mais atrasados em toda a Europa.
Onde, em nome de um socialismo dito democrático, concentrou a riqueza em minorias sociais e grandes grupos económicos e por isso mesmo,  onde o fosso entre ricos e pobres é enorme e onde as desigualdades são maiores em todo o espaço europeu e até mundial.
Um país onde a economia clandestina, ou paralela, que não paga impostos, representa quase um quarto de toda riqueza produzida, obrigando a maioria da população a sacrifícios acrescidos.
Que atingiu níveis de corrupção dos mais elevados a nível europeu e até  mundial.
Um país que tem dificuldade em unir-se em torno de um projecto comum que o faça sair do atoleiro em que se encontra .
Que por via de contradições, egoísmos, oportunismos e antagonismos,  deixou refém a sua juventude e comprometido o seu  futuro.
Um país que não cuidou da evolução demográfica da sua população, que a deixou irremediavelmente envelhecer, com baixa taxa de renovação, que beneficiou e facilitou o aborto e penalizou a natalidade.
Um país que, mercê dos bloqueios institucionais resultantes do paradigma revolucionário de 1974, em suma, se encontra prisioneiro de si próprio e do sistema que criou.

Os factos
- A Revolução de 1974 emerge, por fundamentos forenses dos militares e do drama da guerra colonial, sem a devida ponderação dos prós e dos contras,  sem a devida avaliação dos custos e dos benefícios e sem se esgotarem todas as hipóteses em aberto, deixadas pelo poder político da época;
- Embora de génese democrática  e consequentemente visando instituir a democracia em Portugal, foi precipitada e posteriormente instrumentalizada por militares radicais de esquerda, conotados com o partido comunista e de forças de extrema esquerda, maoístas, trotskistas e marxistas-leninistas.
- Da emergência de uma revolução precipitada e sem se terem ponderado devidamente as consequências, resultou em 1974, num enorme desastre para o país, para os colonos, para as antigas colónias e suas populações e para os movimentos de libertação que, não se entendendo quanto às opções políticas, mergulharam em guerras civis durante décadas, que custaram milhões de mortos e estropeados.
- A instrumentalização e liderança da revolução por militares comunistas e de extrema-esquerda, tentando instaurar em Portugal uma ditadura comunista, destruiu uma grande parte das infra-estruturas económicas herdadas do regime anterior, que foram nacionalizadas e ocupadas pelos trabalhadores (os sovietes da revolução) e amputando o país dos seus principais recursos e meios de produção.
- A escassez de meios económicos e da quebra da produção nacional, levou a liderança da revolução à venda de uma grande parte das reservas de ouro e divisas,  acumuladas, durante meio século pelo regime do Estado Novo, para fazer face à importações de bens e serviços, deixando assim, o país, bastante exaurido de ouro e divisas e provocando a desvalorização da moeda, o escudo.
- A Assembleia Constituinte para elaboração da nova Constituição do país, resultou de eleições realizadas, sob coacção de um ambiente revolucionário socialista e com voto obrigatório, em 25 de Abril de 1975, tendo a Constituição daí resultante sido elaborada por ideólogos de esquerda, conotados com o partido comunista, socialista e de extrema esquerda.
- A contra-revolução de 25 de Novembro de 1975, evitou o pior, por um lado, uma invasão do país por forças estrangeiras lideradas pelos EUA e pela França, pois nunca consentiriam um regime comunista em Portugal, pondo em causa o equilíbrio geoestratégico entre o leste e o oeste, mantido pela chamada «guerra fria» e por outro, tentou repor o processo democrático da revolução, agora com a liderança de militares moderados.
- A nova Constituição, muito extensa (mais de duas centenas de artigos) e demasiado analítica, reflectiu o pensamento dos ideólogos da esquerda portuguesa, optando claramente por uma sociedade «democrática»  a caminho do socialismo, como se encontrava expresso  no seu preâmbulo e tendo sido aprovada em 02 de Abril de 1976, com os votos contra do CDS (Centro Democrático e Social).
- Os governos Constitucionais que se seguiram à nova Constituição do país, os primeiros liderados por Mário Soares, iniciam a governação do país, por um lado com as infra-estruturas económicas muito fragilizadas ou destruídas pela incursão comunista inicial e por outro, limitados e coagidos pela rumo socialista ditado pela Constituição, pelo Processo Revolucionário em Curso (PREC) e pelo controlo exercido por um Conselho da Revolução, garante do regime instituído.
- A inexperiência de Mário Soares em matéria económica, os factores limitativos anteriores, a agitação social reivindicativa e conspirativa e os primeiro passos ensaiados na prática do socialismo e da ditadura do proletariado (de salientar que este objectivo socialista ainda fazia parte, nesta altura, do programa do Partido Socialista),  com a expansão do Estado e do sector público empresarial,  fez disparar a despesa e a dívida públicas:
  Agravamento do défice orçamental (mais de 13% do PIB em 1977)

Agravamento da dívida pública que subiu de cerca de 14% do PIB em 1974 ( o mínimo histórico herdado de Salazar)  para cerca de 25% do PIB em 1977.

● Défice das empresas públicas atinge 8,1% do PIB

Paralelamente:

● Venda de cerca de 172 toneladas de ouro e utilização das reservas em  divisas para compra no exterior de bens essenciais

● Racionamento de bens, devido à escassez de recursos (paralisação do sistema produtivo) e em parte também devida à crise petrolífera de 1973 (combustíveis, pão, arroz, açúcar)

● Subida galopante da inflação


-  Precipita-se assim,  o primeiro colapso financeiro e económico do país e a necessidade da intervenção do FMI em 1977.
Foi o segundo desaire para Portugal, depois da crise de 1974 provocada pela revolução,  com custos pesados para a população e para o país (redução de salários, subida dos impostos e desvalorização da moeda para estimular as exportações e limitar as importações e a saída de divisas).

- A grande instabilidade governativa a partir de 1978, a agitação social, as greves reivindicativas e o radicalismo ideológico,  dificultaram a formação de governos estáveis e muitos tiveram de ser formados por iniciativa do Presidente da República.
- Em conformidade com os ditames da Constituição e a prática do chamado socialismo democrático, tese defendida pelo Partido Socialista, continua a consolidação das nacionalizações dos sectores básicos da Economia, incluindo a Banca e as Companhias de Seguros. A sua gestão controlada pelas Comissões de Trabalhadores e por gestores nomeados segundo a cor partidária dos partidos integrantes dos governos, entra num ciclo de descontrolo irresponsável, de endividamento e de avultados prejuízos, agravando substancialmente o défice do sector empresarial do Estado.
- A admissão de grande número de funcionários para o sector público, aos quais ficaram garantidos os direitos salariais e laborais consagrados na Constituição, faz baixar artificialmente a taxa de desemprego mas que, conjuntamente com a deficiente gestão, excessivos custos e preços de venda artificiais ou sociais, faz disparar a dívida e o défice deste sector.
- A lógica socialista faz aumentar consideravelmente a dimensão do Estado, tanto a nível central como empresarial e autárquico e que, enquadrada com a sua gestão ruinosa e o aproveitamento pelos quadros dirigentes e funcionários, agrava substancialmente a situação das finanças públicas.
- Ao nível do sector privado da economia, a Função de Produção Agregada do país, que representa o conjunto de relações entre o Trabalho e o Capital (trabalhadores e empresas) inicia o ciclo de progressivo desequilíbrio relativamente à distribuição do output  financeiro gerado (rendimento), na linha da lógica socialista implementada no sector público, com claro benefício para os trabalhadores (salários, protecção social) e Estado (impostos e taxas)  e progressivo prejuízo para as empresas, dificultando o autofinanciamento (poupança) para reinvestimento e o necessário crescimento e criação de novos postos de trabalho.
- É necessário o progressivo aumento do esforço fiscal e contributivo para financiar o aumento da dimensão do Estado, o défice crónico do sector público empresarial e o Estado Social (protecção social à população).
- Embora na década de oitenta do século XX,  o Produto Interno Bruto (riqueza criada)  do país, se tenha mantido a taxas de crescimento ainda confortáveis, devido principalmente ao peso dos gastos do Estado (consumo e investimento públicos), o definhar do sector privado já iniciado desde a entrada em vigor da Constituição  em 1976, coloca em trajectória decrescente a capacidade do país em criar riqueza,  devido principalmente ao desequilíbrio da Função de Produção Agregada (do conjunto do país) em favor de uma das partes, na lógica do modelo socialista de desenvolvimento, decorrente da revolução.
- Na linha desta lógica, o regime instituído tenta conciliar dois mundos antagónicos. Por um lado  uma economia social de mercado e por outro, um modelo de desenvolvimento socialista baseado numa economia pública, esvaziando aquela em benefício desta.
- O processo de instabilidade política e social do país, do crescimento excessivo do Estado e sector público, do despesismo e gestão ruinosa, do enfraquecimento económico e financeiro do sector privado e consequente diminuição da capacidade do país em criar riqueza, culmina em 1983, com nova bancarrota e a necessária ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI).
- A partir de 1985 e até 1995 o chamado «cavaquismo» do nome do 1º ministro Aníbal Cavaco Silva, tenta travar  a trajectória seguida pela economia portuguesa com predomínio da componente pública, comprovadamente a arruinar o país e aproveita a entrada de Portugal na então CEE e com ela a transferência de avultadas ajudas financeiras (fundos de coesão) para relançar a economia privada e lançar arrojados projectos de investimento  público.
- O «cavaquismo» tenta assim, por um lado relançar a economia privada, já nesta altura com grau preocupante de asfixia resultante do modelo socialista adoptado e por outro, seguindo uma lógica Keynesiana, lançar grandes projectos de obras públicas para criar emprego e fazer subir o Produto Interno Bruto.
- Tenta-se travar os efeitos nefastos do sector público nacionalizado pela revolução, pelo acumular de défices e dívidas sucessivas resultantes do aproveitamento e oportunismo dos gestores e funcionários, pondo em prática um plano de privatizações de grande parte desse sector.
- O ímpeto revolucionário socialista é travado e parcialmente estabilizado, mas os efeitos ao nível da economia privada são igualmente limitados, por um lado não se estabiliza em níveis aceitáveis a drenagem de rendimento deste sector para o sector público, em face do crescimento  excessivo do Estado e por outro, devido ao  mau aproveitamento dos fundos comunitários transferidos para Portugal pela Comunidade Económica Europeia, pois grande parte destes fundos foram desviados para fins diversos daqueles a que se destinavam.
- Com o «cavaquismo» houve altos e baixos em termos de crescimento, embora a tendência geral tenha sido de queda do Produto Interno em face do limitado alcance prático das suas medidas, face a constrangimentos constitucionais, dos grandes poderes das centrais sindicais que o impediram e do oportunismo, aproveitamento e gestão ruinosa do sector público.
- A gestão do país durante o período cavaquista demonstrou à evidência a incompatibilidade entre os ditames de uma Constituição de génese socialista, com os modelos sociais-democratas e sociais-centristas que, embora resultantes de eleições legítimas, não puderam ser postos em prática devido a limitações constitucionais. As grandes reformas de fundo necessárias ao desenvolvimento do país, não puderam assim, ser implementadas, porque antagónicas com o regime imposto pela revolução de 1974.

  Evolução da economia portuguesa a partir do período cavaquista
Com altos e baixos a trajectória decrescente herdada do soarismo, é notória


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