segunda-feira, 29 de outubro de 2012

A ÚLTIMA FALÁCIA DE GASPAR: QUE ESTADO SOCIAL QUEREMOS

 
 
 
 
 
Numa das últimas intervenções do Ministro das Finanças na Assembleia da República, assistimos a mais uma afirmação, que tem tanto de falaciosa como de ofensiva da dignidade do povo português.
 
Falaciosa, porque saiu da boca de alguém que, saído da comodidade dos gabinetes de estudos de órgãos da EU, tem muito pouca noção da realidade portuguesa em matéria de estado social e ofensiva porque, nas presentes circunstâncias, de extremas dificuldades para os portugueses, de que ele próprio foi co-responsável, por falta de visão e inoperância negocial, com os nossos credores, não tinha o mínimo cabimento.
 
Disse Victor Gaspar, há dias, na Assembleia da República que, e cito, «OS PORTUGUESES TÊM DE ESCOLHER ENTRE O ESTADO (E O ESTADO SOCIAL) QUE QUEREM E OS IMPOSTOS QUE ESTÃO DISPOSTOS A PAGAR».
 
Quis Victor Gaspar dizer que, se  os portugueses querem uma protecção social de nível mais elevado (na saúde, na educação, no desemprego, na maternidade, no apoio à família, nas baixas por doença, na pobreza, na velhice, na reforma, etc) têm  de pagar mais impostos e contribuições (presume-se, além daqueles que já pagam).
Gaspar estaria certamente a pensar na grande contestação social, que grassa por todo o país, sobre os cortes sistemáticos nas prestações sociais, mesmo dos mais carenciados e em situação de pobreza.
 
E, sendo assim, estaria o ministro a pensar que essa contestação generalizada, não tem qualquer cabimento, os portugueses não têm razão para se manifestarem, porque o nível de impostos e contribuições que pagam, não é suficiente, para o nível de protecção social que desejam, ou seja, saúde e educação gratuitas para todos e prestações sociais mais ou menos elevadas.
 
Como a realidade dos factos demonstra, aos cortes sistemáticos no apoio social, incluindo reformas e subsídios de desemprego, do regime contributivo, têm correspondido sistemáticos aumentos de impostos.
 
Mas, o que é sintomático e preocupante, da completa abstracção, ignorância ou talvez conivência com o poder instituído, de pessoas e comentadores responsáveis deste país, servindo-se dos órgãos mediáticos, que têm o poder de ter à sua disposição, virem a público afirmar que Gaspar tem toda a razão e faz todo o sentido a afirmação que proferiu.
Mais uma vez,  muita gente responsável deste país,  incluindo Gaspar, parece andar distraída e a confundir a forma com o conteúdo e as aparências com a realidade.
 
De facto, qualquer cidadão comum percebe, que os sistemáticos aumentos de impostos a que os cidadãos têm sido sujeitos (que já vêm dos últimos dez anos) se têm destinado, não ao aumento do nível de protecção social e ao aumento da qualidade dos serviços prestados pelos órgãos do Estado, mas para pagar dívidas contraídas pelos políticos, em nome do país, para fazer face ao despesismo ostensivo e exagerado do Estado (incluindo mordomias, alcavalas e salários principescos dos seus agentes) e, bem recentemente, para 2013, fazer face as resvalar do défice orçamental de 2012, por culpa do próprio Gaspar e, hipoteticamente, conseguir reduzir o défice das finanças públicas em 2013 para 4,5% do PIB (valor ajustado para cima, após a 5ª avaliação) e para 2,5% do PIB em 2014.
 
Portanto, bem podem vir os arautos do regime apregoar o inverosímil, o aparente, o ilusório, o contraditório, a cereja em cima do bolo, ocultando o podre conteúdo, porque qualquer cidadão atento, entende que a afirmação de Gaspar,  não passa de uma grosseira hipocrisia.
 
O que está a obrigar os portugueses a suportar este enorme esforço fiscal, já muito acima dos limites do sustentável, para cidadãos e sistema económico, não é a melhoria do estado do social e do nível de protecção social dos cidadãos, mas sim para alimentar a fome insaciável, dum monstro a que se chama Estado.
Estado esse que, em troca dos impostos esmagadores que a maioria dos cidadãos tem de suportar, para satisfazer a sua saga devoradora, pouco ou nada lhe dá em troca. Tudo tem de ser pago.
 
Desde o simples estacionamento de um veículo na via pública, da água que bebe, daquilo que come, duma certidão, da utilização da justiça, dum registo numa conservatória, duma licença, duma simples informação, todos os serviços prestados pelo Estado são pagos e bem pagos, tudo é taxado.
A própria saúde já é paga, a educação pública, ao nível universitário já é paga e cada vez mais cara, as prestações sociais, do tão badalado estado social, cada vez mais baixas, as reformas que resultaram da capitalização de descontos de décadas na vida activa, estão a ser cortadas.
 
Então, para que servem os nossos impostos?
 
A hipócrita afirmação de Gaspar só faria algum sentido, se a economia estivesse a crescer 3 ou 4% no mínimo, a dívida publica estivesse abaixo dos 60% do PIB ( o limite crítico e neste momento está no dobro, com juros de usura), os juros da dívida a 1,5-2% no máximo, o Estado reduzido a metade, cumprindo apenas as suas tarefas essenciais, com toda a eficiência e tendencialmente gratuitas, em troca daquilo que lhe entregamos em impostos e contribuições.
 
Aí sim , os cidadãos teriam de optar!


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