Depois da tríade oligárquica, económica, política e estatal, que
tem impedido o nosso desenvolvimento, por um mecanismo de promiscuidade e
favorecimento diferenciados entre eles, a Constituição de 1976, constitui o
quarto poder deste sistema que comanda o
país.
Muitas vezes
esquecido, este poder de natureza legal e fundamental, que nos tem mantido
prisioneiros durante quase meio século, constitui um dos principais obstáculos
e o mais difícil de transpor, pelo seu mecanismo blindado de auto sobrevivência
e pela teimosia dos políticos do Centrão (os que o poderiam transpor), em não
alterá-la, por a considerem fundamentalisticamente sagrada e pretensamente
defensora dos direitos dos destinatários,
Este
documento, elaborado e aprovado no chamado Verão Quente de 1975, um ano depois
da revolução, portanto num ambiente revolucionário extremamente tumultuoso e
coactivo, tem sido, até hoje, a nossa Lei Fundamental, a partir da qual todas
as outras emanam e têm de estar conformes, sob pena de não vingarem.
As alterações até
agora efectuadas a este documento, apenas contemplaram ajustamentos ao direito
comunitário, obrigação imposta do exterior pelos Tratados Europeus assinados,
um pequeno polimento para atenuar a carga ideológica socialista que se
pretendia impor pela revolução de 1974 e reivindicações de grupos
ultraminoritários, designadamente dos homossexuais.
Excluídas
estas alterações menores e sem grande impacto no conteúdo geral da
Constituição, esta mantêm, no essencial, as mesmas regras aprovadas em 1975.
No meu ponto de vista,
a Constituição de 1976, apresenta três grandes e fortes limitações:
1ª
– É demasiado extensa (parece que a mais
extensa do mundo), com quase trezentos artigos e mais do dobro de números e alíneas
e é feita de regras rígidas e extremamente minuciosas, inspiradas numa
miscelânea de modelos socialistas do passado;
2ª
- É blindada quanto à revisão ou alteração de algumas regras, a mais limitativa
das quais, a obrigatoriedade de representação proporcional (de deputados oriundos
exclusivamente de partidos e propostos por partidos) na Assembleia da República;
3ª
– Definição de direitos, liberdades e garantias, com natureza ilimitada ou
absoluta.
Quanto à primeira
limitação, o principal inconveniente é a falta de flexibilidade, ou seja, as
regras são tão rígidas e minuciosas que, qualquer governo corre o risco de, ao
introduzir uma reforma ou inovação em qualquer área da governação ou da
sociedade, por vezes uma simples palavra ou frase, infringir essas regras e a
norma ser considerada inconstitucional.
Esta
minúcia obriga a que, governos do centro ou da direita e por vezes alguns ditos
de esquerda, os que terão maior probabilidade de apresentar propostas
governativas diferentes, tenham de governar à esquerda e portanto segundo o
modelo rígido e minucioso, constitucional.
Podemos imaginar o que
sucederia se o país precisasse de introduzir reformas de fundo, que implicassem
uma alteração profunda das suas estruturas. Ficaria completamente
impossibilitado.
É o que hoje está a
acontecer na grave emergência nacional que estamos a viver.
Estava a terminar esta reflexão e há poucas horas o sindicato dos magistrados do Ministério Público anunciava publicamente que as medidas de austeridade eram insconstitucionais.
É a interpretação jurídica a funcionar, porque na interpretação económica elas, independentemente daquela interpretação, são acima de tudo erradas pelas consequências nefastas que irá ter para todos nós e para o país no seu conjunto.
Estava a terminar esta reflexão e há poucas horas o sindicato dos magistrados do Ministério Público anunciava publicamente que as medidas de austeridade eram insconstitucionais.
É a interpretação jurídica a funcionar, porque na interpretação económica elas, independentemente daquela interpretação, são acima de tudo erradas pelas consequências nefastas que irá ter para todos nós e para o país no seu conjunto.
A
segunda limitação, tendo a ver com a proibição de alterar ou rever algumas
normas constitucionais, designadamente o modelo económico de desenvolvimento e
a regra da representação proporcional por lista fechada ( o eleitor vota em
partidos e não em pessoas), utilizando-se o método de Hondt para eleição dos
deputados.
Quanto
ao modelo de desenvolvimento, embora a Lei Fundamental não defina a proporção
ou peso de cada sector económico, no sistema proposto de economia mista
(privado, público e cooperativo e social), a verdade é que o sistema económico
português evoluiu para um peso excessivo do Estado (incluindo toda a sua
estrutura orgânica e autárquica, que cresceu de forma desmesurada) e do sector
público empresarial (sectores básicos da economia e empresas autárquicas) que, por
via, da sua gestão danosa e nalguns casos dolosa, originou encargos adicionais
incomportáveis para o Estado.
Paradoxalmente, a
pouca flexibilidade existente nesta área, foi explorada, no pior sentido, pelos
políticos do nosso sistema e explica, em boa parte, o rumo desastroso a que
conduziram o país.
Relativamente
ao sistema de representação proporcional, em lista fechada, a proibição de
rever ou alterar esta norma, impede o
aperfeiçoamento do sistema democrático, para formas mais evoluídas de
democracia, favorecendo o jogo partidário segundo os seus interesses e
excluindo a população do processo de escolha do seus candidatos, isto é, das
suas regiões ( são os partidos que nomeiam os candidatos e muitos nem sequer conhecem
as regiões que representam).
Todas
estas limitações têm implicado uma instabilidade política quase permanente,
crises permanentes, conduziu o país à falência e acima de tudo, têm impedido a
realização das reformas de fundo ou estruturais, que seriam inconstitucionais,
mas que teriam aberto caminho a uma rota de crescimento e desenvolvimento do
país, pressupondo, naturalmente, uma governação responsável e competente, o que
infelizmente também não aconteceu em quase quarenta anos desta democracia.
Se
compararmos, apenas aqui na Europa, as constituições dos diversos países, todas
são muito menos extensas e minuciosas do que a nossa e, no caso particular dos
países nórdicos incluindo o Reino Unido, as suas constituições são diminutas e
privilegiando um conjunto de princípios gerais, muito poucas regras e evitando
a minúcia, exactamente para permitir a governação flexível, que permita aos
diferentes governos, aplicar e adaptar os seus programas e implementar as
reformas necessárias, que permitam o progresso dos países.
Em
contraste, os países do sul, têm constituições moderadamente extensas, com mais regras, mas ainda assim,
nada comparáveis à portuguesa, que excede em exagero todos os recordes a nível mundial, o que é característico de países
saídos de ditaduras e que lidam mal com situações de incerteza.
Quanto
à terceira limitação, a Lei Fundamental, ao definir direitos, liberdades e
garantidas, não impondo qualquer limitação e portanto pressupondo a sua
natureza absoluta e ilimitada, significa que qualquer cidadão, grupo de
cidadãos, organização ou instituição, dentro da sua esfera de acção, poderá revindicar
direitos, realistas ou irrealistas, sem serem ponderadas ou avaliadas as suas
consequências.
Isto significa que
esses direitos têm de ser satisfeitos, haja ou não recursos para os satisfazer,
provoque ou não injustiças sociais, prejudique ou não gravemente os interesses
superiores do país.
Ou seja, não são
comparados os direitos reivindicados, com os prejuízos e as injustiças que
podem causar.
Inúmeros
exemplos poderiam ser dados, ao longo de quase quarenta anos desta democracia
semi-representativa, de abuso e chantagem, proporcionado pela utilização deste
direito constitucional.
O mais revoltante
exemplo, entre outros, podemos encontrá-lo no sector dos transportes públicos (terrestres
e aéreos) em que, greves selvagens e chantagistas, contribuíram significativamente
para a sua ruina, ocasionaram enormes injustiças sociais e prejudicaram
gravemente o país.
A renitência do nosso sistema partidário, em alterar esta Constituição, lesou gravemente o país
e a maioria da sua população e apenas beneficiou os agentes do sistema, o
grande poder económico, o Estado e minorias privilegiadas colocadas em sectores
económicos estratégicos.
Talvez
isto explique, estou convicto, o fundamentalismo partidário relativamente a
esta Constituição.
No
meu entender, o país só conseguirá trilhar o caminho da estabilidade, da
justiça, do crescimento e do desenvolvimento, depois de vencidos estes quatro
gigantes que têm esmagado o Povo Português:
-
A Constituição, o Sistema Político viciado tal como está concebido, o favoritismo
e excessivo Poder dos Grandes Grupos Económicos e o gigantismo e o excessivo
Poder do Estado.
Só assim, poderemos
abrir caminho a um Novo Sistema Político e a um Novo Modelo de Desenvolvimento económico
e social.
Até lá, teremos
primeiro de arrumar a casa e passar por dias difíceis, pois a pesada herança
deixada pelos políticos ao Povo Português, assim o obriga, com troika ou sem troika.
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