Em quarenta anos de III
República, o país nunca, ou muito raramente, conheceu um período de
estabilidade.
Quase sempre essa instabilidade
política, económica e social, com consequências financeiras, radica num modelo
de desenvolvimento baseado num desequilibro muito acentuado, entre um pesado
aparelho estatal, incluindo o Estado Central, Autárquico, Empresarial e Orgânico
e a estrutura económica e financeira de suporte, cujo principal esforço fiscal
e contributivo é exigido ao sector privado da economia e aos cidadãos em geral.
Por mais que
a Constituição de Abril imponha um dimensionamento e estrutura do Estado e todo o seu sector
público agregado e uma estrutura de rendimentos dos seus agentes, completamente fora dos limites suportáveis
para o país, a verdade é que, a experiência vivida nesta III República de
democracia representativa, mostra-nos claramente, desde há muito, o erro em que
esse modelo caiu.
E a insistência nesse erro ou se
quisermos, por imposição constitucional, a obrigatoriedade de o seguir e
persistir nele, sem que os agentes políticos, por opção ideológica, irrealismo
ou por simples falta de vontade, ajustem a Constituição, flexibilizando as
normas e desta forma, permitindo corrigir o erro e seguir outro caminho, tem
sido um grande obstáculo ao nosso desenvolvimento.
Mas, a
instabilidade do regime radica também em normas constitucionais rígidas que, no
campo dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e das organizações
sindicais, consagra-os como absolutos, ilimitados e inalienáveis, contrariando
frontalmente aquilo que, em democracia, devia ser sempre relativizado, isto é,
os direitos e liberdades de uns, não podem sobrepor-se totalmente aos direitos
e liberdades de outros.
Com efeito, este absolutismo
constitucional conduziu ao abuso, ao oportunismo, à chantagem e a toda espécie
de acções perversas que beneficiaram excessivamente certos sectores da
sociedade, especialmente os integrados no Estado e Sector Público, e causou graves prejuízos a outros.
Esta situação, não apenas agravou
substancialmente o equilíbrio das finanças públicas, já de si comprometido pelo
efeito dimensão, como criou clivagens, injustiças e desigualdades flagrantes na
sociedade portuguesa.
Apenas a
título de exemplo, hoje, um motorista/maquinista de uma empresa pública de
transportes, terrestres ou marítimos, aufere um vencimento mensal, integrado
com todos os suplementos, da ordem dos 4.000 euros e um Licenciado, numa
empresa privada ganhará, com muita sorte, quatro vezes menos e, na prática não
pode fazer greve, pois se o fizer, o seu posto de trabalho, pode estar em
causa.
O primeiro
pode ter casa própria para habitação, acima da média, e ainda uma segunda
habitação para passar férias e deslocar-se em carro de gama alta.
O segundo, qualificado
acima da média e tendo gasto muitos anos da sua vida nessa qualificação, não
tem acesso a nada disto, vive na casinha dos pais e está impedido de constituir
família!
Finalmente a
outra perversidade do Estado e Sector Público.
O nosso modelo,
dito socialista, também apelidado de socialismo de rosto humano, ou moderado, para
se diferenciar do socialismo totalitário (o de rosto desumano), assenta no
princípio da REDISTRIBUIÇÃO, aparentemente inofensivo e impregnado de áureas de
justiça social (tirar aos que têm mais, para dar aos que têm menos) em ordem a
atingir o igualitarismo económico, revelou-se de enorme perversidade e
injustiça social.
Desde logo,
trata-se de uma espécie de COMUNISMO INDIRECTO,
aparentemente menos doloroso mas, na prática atingindo os mesmos
objectivos, ou quase, do chamado COMUNISMO ESTATAL, baseado num centralismo total do Estado, na
colectivização de todos os meios de produção, numa distribuição directa de
rendimento e num igualitarismo económico de baixa amplitude (rendimentos per
capita, muito baixos).
Depois, o
próprio processo de redistribuição, em que o Estado age como intermediário é,
em si próprio, perverso, como é regra em todos os processos em que entram
intermediários.
Desde logo
cego, a montante, pois não atente à qualificação do titular, nem à forma como
foi obtido o rendimento, e a jusante, no processo de redistribuição, por um
lado descontrolado e por outro cometendo-se muitas injustiças na atribuição,
premiando o ócio em detrimento do contributo de pessoas válidas para o trabalho
activo.
Pelo meio, uma
aplicação dos recursos públicos retirados do sistema económico e dos cidadãos,
obedecendo a critérios muitas vezes irracionais e motivados pela pressão de
lóbis e sem efeito reprodutivo na economia, a estrutura produtora de riqueza.
Criou-se, assim, uma sociedade
desequilibrada, extremamente desigual, onde milhões de cidadãos contribuem
directa ou indirectamente, com uma grande parte dos seus magros rendimentos, para
engordar um Estado despesista, coabitando o sobreemprego com baixos níveis de produtividade,
como tal sobredimensionado, para privilégios de uns e excessiva concentração de
riqueza de outros.
E nestes outros, coabitando a
grande concentração económica e os benefícios de muitos que conseguem manter-se
na economia paralela, iludindo o Estado e sacrificando a maioria dos cidadãos,
sobrecarregados, desta forma, com um excessivo esforço fiscal.
Concluindo,
por mais que a irrevogável e perpétua Constituição, imponha e aponte este
caminho, a verdade é que o caminho seguido sempre nos conduziu à estagnação
económica, ao colapso das finanças públicas, agravado por um perturbador factor
externo, a integração do país na zona euro e a uma sociedade de minorias
privilegiadas, construída na base da completa exploração e exclusão, de milhões
de concidadãos.
Em suma, a uma sociedade empobrecida,
endividada, extremamente desigual, subdesenvolvida e por isso, com perfil terceiro-mundista.
Um vergonhoso paradoxo constitucional
e nacional, do qual não se vislumbra saída.
E, na nebulosa do regime, é o salve-se
quem puder…