A transição do regime autoritário
da II República para a III, a República de Abril e pretensamente de democracia
representativa pluralista, infelizmente, não foi pacífica.
Mau grado saído de uma guerra colonial
em três frentes distintas em África, o país crescia economicamente, nos anos 70
do século passado, a taxas perto dos 7% ao ano.
O golpe de
Estado de Abril de 1974, rapidamente se transformou numa revolução socialista
radical e destruiu, em muito pouco tempo, as principais infra-estruturas
económicas e financeiras do país.
Empunhando
as bandeiras revolucionárias do socialismo, a vanguarda da revolução perdeu,
por completo, a noção da realidade. A ideologia marxista-leninista falou mais
alto e impôs a sua vontade.
Em pouco mais de um ano, Portugal
transformou-se num caos.
A queda
brusca da economia e da produção nacionais, provocou escassez de recursos,
incluindo os financeiros.
Grande parte
do ouro que havia em reserva, e eram algumas centenas de toneladas, começou a
ser vendido, como forma se suprir as necessidades internas do país.
Apesar do
contragolpe corrector de 1975, o mal estava feito e era irreversível.
Bastaram
três anos, seguintes à revolução, e o país estava em bancarrota, sendo obrigado
a pedir a ajuda ao Fundo Monetário Internacional.
O primeiro colapso da III
República ocorre aqui, apenas três anos depois da revolução.
Muito cedo, na áurea do novo
regime, as leis implacáveis da ideologia e do dogma, ofuscaram completamente a
realidade.
A doutrinação popular e as
campanhas de «dinamização cultural» marxistas-leninistas-trotskistas, pelo
interior do país, ajudaram bastante.
Em síntese,
em vez da revolução manter as infra-estruturas existentes, preservá-las, mantê-las
em funcionamento, porque vitais para o país e depois, com tempo e em verdadeira
democracia, reestruturá-las e reformá-las de forma negociada com os seus
proprietários, ao invés, a opção ideológica ditou a sua destruição.
Portugal não se limitou a parar
no tempo. Regrediu décadas.
Países
europeus, designadamente a Espanha, saídos igualmente de ditaduras por essa
altura, tiveram melhor sorte. O realismo predominou e a transição foi pacífica.
Não regrediram, avançaram no tempo.
O país retomou
o seu caminho, pretensamente numa democracia representativa, arrancada a ferros
aos patrões de uma revolução socialista, que o deixou muito fragilizado.
A retoma foi
e continua a ser penosa, pelos factos decorrentes da revolução.
Um vez mais, nas encruzilhadas da
História, Portugal não soube encontrar o seu verdadeiro caminho, esse caminho
que, com realismo, bom senso, união nacional e inteligência no bom
aproveitamento dos nossos recursos, nos poderia ter conduzido a uma espécie de
nova «Suíça da Europa»
Embora
ofuscados e desvalorizados por Abril, os que ainda acreditam nas virtudes deste
modelo, a verdade é que, os factos atrás descritos e que ocorreram na
realidade, condicionaram toda a nossa acção e desenvolvimento futuros.
Outros
ocorridos posteriormente, também por falhas, erros e oportunismos dos actores
políticos e sociais, na gestão do sistema democrático, potenciaram os
condicionalismos e fragilidades nascidas com Abril.
É verdade
que alguns protagonistas da política chegados ao poder, tentaram corrigir
desmandos e factos condicionantes e, a partir daí, tentar relançar as bases
para um novo caminho.
Pouco ou
nenhum sucesso tiveram. Uns foram derrubados pela saga ideológica e
revolucionária e outros obrigados a trilhar o mesmo caminho para se aguentarem
no poder.
Três bancarrotas é o balanço,
para já, da III República. A última saiu-nos demasiado cara e está a por em
causa a nossa autonomia e até sobrevivência enquanto Nação e enquanto Povo.
Uma
Constituição demasiado rígida, demasiado extensa e completamente hermética a
revisões de ajustamento às realidades presentes e futuras, saída da revolução
de Abril, mas que, paradoxalmente beneficia minorias sociais, foi formatada ao
milímetro para se eternizar e garantir a permanência dos dogmas da revolução.
Um Tribunal
Constitucional, político, porque escolhido por políticos, quando devia ser
constituído por juízes independentes, eleitos por comissões especializadas
multidisciplinares, foi criado para servir de guardião da Constituição e dos seus
dogmas eternos e sagrados, mas flexibilizados, por vezes, conforme o seu peso
partidário.
Nenhuma
reforma séria do Estado e da estrutura do país pode ser feita sem a sua sanção
suprema.
Por esse
facto, alguns governos, podem ficar impedidos de governar e aplicar os seus
programas ao país.
E mais,
novos partidos e novas alternativas políticas, ficam igualmente impedidos de
chegar ao poder e dessa forma aplicar igualmente os seus programas.
Por outras
palavras, o regime saído de Abril, a III República, não passa de uma falsa
democracia, uma democracia limitada a um número limitado de partidos, apenas os
que partilham a ideologia da revolução de Abril.
Portugal encontra-se assim,
refém, cativo de um sistema e de um modelo ideológico que lhe foi imposto pela
revolução de 1974, uma grande limitação que outros países tiveram a sorte de
não ter.
E, no quadro institucional
vigente, é praticamente impossível alterá-lo, mesmo perante a evidência dos
seus maus resultados, por um lado, agindo pela exploração implacável de milhões
de portugueses e, por outro, de forma absurda, favorecendo e incentivando, pela
sua manipulação, a grande concentração económica, financeira e corporativa.
Tudo à sombra das bandeiras do
socialismo e da social democracia, como armas de persuasão e de crença no
paraíso, para convencer as incautas massas populares.
O problema de fundo do país e que
condiciona todos os outros, está diagnosticado há muito.
Chama-se Estado.
A sua
estrutura gigantesca, completamente sobredimensionada e portanto, absurda para
a dimensão e necessidades do país, absorve um excesso de recursos que o fraco
potencial económico e financeiro do país, não tem capacidade para suportar, sob
pena da sua asfixia e dos cidadãos, cujos rendimentos provêm desse sistema
económico, impedindo o crescimento e desenvolvimento.
Os órgãos e
estruturas em excesso, têm servido, por um lado, para coito e emprego de muitos
milhares de pessoas, quase sempre ligadas a partidos, amigos, conhecidos, acção
social a minorias étnicas, proporcionando-lhes emprego e muito mais.
A sobre
dimensão arrasta consigo outros problemas, pelo aproveitamento dos agentes
públicos, completamente imunes:
- Endividamento
excessivo, aquisições de bens e serviços por ajuste directo (leia-se sem
concurso) aumentando e derrapando a despesa pública e muitas vezes reduzindo a
qualidade dos fornecimentos e, obras desnecessárias disparando a despesa e campo
fértil para a corrupção.
Este modelo incentivado pelo
regime de Abril e caminho apontado pela Constituição, tem arruinado o país, não
apenas pelo efeito dimensão, mas também, com peso idêntico, pelo abuso
despesista dos agentes, sem que sejam responsabilizados.
Não é por
acaso que, em três anos de austeridade imposta ao país, que atingiu preferencialmente
os mais vulneráveis, a despesa pública nunca desceu, sempre aumentou,
exactamente porque não se reformou a estrutura, que está praticamente intacta.
Cativo de um regime
contraditório, porque beneficia poucos, em detrimento e pela exploração de
muitos, por um lado, e por outro, porque, mau grado a experiência histórica do
modelo de desenvolvimento seguido, ser comprovadamente negativa, com os
problemas de fundo bem identificados e diagnosticados, não consegue dar-lhes a
solução adequada, pelos constrangimentos ideológicos e institucionais.
Portugal arrisca-se, assim, a ser
um país eternamente adiado ou mesmo sem solução e o seu povo remetido a uma
pobreza explícita ou envergonhada, no fundo um país despromovido à condição de
terceiro-mundista, dentro da União Europeia.