As pessoas mais esclarecidas deste país, e são muitas, felizmente,
sabem que Portugal podia ser, com inteligência e políticas realistas e
equilibradas, uma nova Suíça da Europa.
Próspero no sentido económico, com um bom rendimento médios per capita
e desenvolvido em todas as vertentes do desenvolvimento de uma sociedade e de
um povo: na ciência e tecnologia, na cultura, na educação, no apoio social, num
excelente sistema de aposentação.
Antes de prosseguir e para percebermos o que quero dizer e onde,
infelizmente nos situamos, conto-vos uma HISTÓRIA
VERÍDICA, ocorrida há pouco tempo, num supermercado.
Eu e a minha mulher, depois das compras, dirigimo-nos a uma das
caixas para pagamento. Um pouco antes de chegar a nossa vez, verificámos que a
jovem empregada da caixa, chorava de forma visível, mas lá ia, não sem
dificuldade, cumprindo a sua tarefa.
Nenhuma das pessoas que estavam à nossa frente se importunou com o
que estava a acontecer.
Quando chegou a nossa vez, a rapariga desata num choro incontrolável.
As lágrimas corriam-lhe pelo rosto abaixo.
E nós perguntámos: «amiga, o que se passa consigo? Sente-se mal? Precisa
de ajuda? Diga, nós ajudá-la-emos!»
Ela, aos soluços, respondeu. Muito obrigado pela vossa
preocupação, mas a ajuda de que eu preciso, os senhores, por muito boa vontade
que tenham, nunca a conseguirão concretizar.
Pela forma como se expressava, via-se, claramente, que era uma
pessoa culta e educada.
As pessoas, atrás de nós, começavam a queixar-se da demora. Alguns
diziam: se a senhora não está em condições de trabalhar, deve ser substituída,
revelando total indiferença pelo sofrimento dos outros!
Virei-me para trás e pedi calma.
Insisti, com a rapariga e disse-lhe: fale, desabafe, pode ser que
haja uma solução e a possamos ajudar.
Ela, voltando aos soluços e muito nervosa, lá desabafou:
«Aquilo
que eu sempre sonhei, por que tanto lutei, me esforcei e trabalhei, todas as
minhas esperanças se perderam e desvaneceram.
Eu
sou advogada, ainda não tenho trinta anos e eu estou reduzida à minha
insignificância, num trabalho que antigamente chegava a 4ª classe para o desempenhar,
ganho uma miséria de € 450 que mal me dá para comer, trabalho como uma escrava
e ainda por cima não tenho jeito nenhum para o fazer e arrisco-me a ser
despedida».
As
lágrimas afloraram também aos nossos olhos. Pedi-lhe que me desse o seu
contacto e, se a pudéssemos ajudar o faríamos.
O resto da história, não vale a pena continuá-la, pois ainda não
terminou. Por mais contactos que já tenha feito, nenhum se disponibilizou para
a ajudar. Se a minha empresa estivesse ainda activa, não teria hesitado e, tê-la-ia ajudado
com um trabalho compatível com a sua área de formação, o Direito.
Esta
pequena história, muito recente, serviu como dramática introdução a esta
reflexão e para percebermos, como este regime e estes protagonistas, arruinaram
o nosso país, ao ponto de castigarem e esmagarem, impiedosamente, toda uma
geração, os nossos filhos e, com muita probabilidade, também os nossos netos.
O regime político, iniciado com o golpe de Estado de 25 de Abril
de 1974, alegadamente democrático, em sistema parlamentarista e alegadamente
representativo, é um facto, gerou a situação anteriormente descrita, a muitas
raparigas da caixa e a muitos jovens e adultos portugueses condenados a
empregos precários, quase de escravatura ou pior ainda, a não terem emprego e a
viverem na casa dos pais.
São estas, entre muitas, as consequências negativas visíveis: negar uma vida digna a muitos milhões de
portugueses e, aos mais jovens, impedi-los de constituir uma família e construir
a sua vida. E terem de emigrar.
Mas, o importante, nos dias de hoje, já não será tanto
debruçarmo-nos sobre as consequências, já nos vamos, lamentavelmente habituando
a elas, remetidos a uma resiliência e a um fatalismo quase irreversíveis.
O importante, hoje, é o balanço,
o juízo, a identificação das causas, a análise crítica ao que tem sido o
«regime abrilista», no fundo, ao julgamento da História recente de Portugal,
nas últimas quatro décadas.