quinta-feira, 29 de novembro de 2012

A QUESTÃO IDEOLÓGICA E O NOVO MODELO DE SOCIEDADE


 
 
Tem estado na ordem do dia uma questão de crucial importância para o nosso futuro colectivo.
É a questão da refundação do Estado, da reforma do Estado, do novo modelo de Estado Social e, por inerência, o novo Modelo de Sociedade.
 
Esta questão tem vindo a ser abordada, desde algum tempo, a propósito do corte de quatro mil milhões de euros nas despesas do Estado, tudo apontando para as áreas sociais: saúde, educação, prestações sociais, reformas.
 
A reflexão a que hoje me propus dedicar, não terá tanto a ver com a lógica destes cortes nas áreas referidas, que são discutíveis, até porque nem sequer se fala das outras áreas do Estado (autarquias e toda a estrutura orgânica dependente do Estado e a renegociação das PPP´s e contratos das rendas energéticas, que deviam ser objecto de cortes muito mais significativos) onde, no meu ponto de vista, aqueles deviam começar, em primeira prioridade.
 
Como sempre é meu propósito, procuro sempre ir ao fundo das questões, não ficando satisfeito apenas com as análises de forma, mas analisando os conteúdos.
 
Esta discussão e o debate sobre este tema da refundação do Estado, ganhou nova dinâmica, após a entrevista do primeiro-ministro, na 4ª feira dia 28 de Novembro à TVI, após a aprovação do Orçamento do Estado para 2013 pela Assembleia da República.
 
Em quase todos os canais o tema foi exaustivamente discutido, por comentadores das áreas política, económica, jornalística, jurídica e até por politólogos.
 
Respeitando, como sempre o faço, as opiniões desses comentadores, muito diversas,  notou-se, contudo,  em quase todas, a presença da tónica na carga ideológica e fazendo da ideologia o aspecto central do debate, a partir da qual a solução para o problema do Estado e tudo o que dele depende, tem de ser desenhado.
 
No meu ponto de vista, crítico em relação a estas questões, a maior parte dos comentadores, centrando-se na ideologia como ponto de partida, mais uma vez e como é usual, não se foi ao fundo das questões e a análise, por esse facto, ficou-se pela forma, pela aparência, pela superficialidade.
 
É que, a ideologia, aquilo que desejaríamos como o ideal, segundo as concepções de cada um de nós, pode afastar-se muito do real e, por isso, o ponto de partida deveria ser sempre a tentativa do domínio e do conhecimento do real.
 
Quer isto dizer que, o ponto de partida para qualquer proposta de desenho de uma sociedade, para a definição de qualquer estratégia de desenvolvimento e para a concepção de um novo estado social, deve ser sempre a avaliação dos meios e recursos de que dispomos e da sua capacidade para criar riqueza, distribuí-la com justiça e equidade e que possa garantir um nível aceitável de apoio social.
 
Partir da ideologia para qualquer acção concreta, sem previamente se avaliarem os meios e os recursos existentes, é a mesma coisa que um General decidir lançar-se numa operação militar em larga escala, sem avaliar previamente os recursos do inimigo e compará-los com os seus próprios recursos.
Se o fizer, ou terá muita sorte, ou estará condenado ao desastre. Como a sorte «dá muito trabalho», o mais provável será o desastre.
 
Foi sempre este o erro em que incorreu a sociedade portuguesa, por via das crenças ideológicas e das utopias. Pensar-se que o ideal era a mesma coisa que o real.
 
Por isso o enquadramento institucional, partindo da ideologia e do ideal, falhou porque se afastou substancialmente do real e porque não se avaliaram convenientemente os recursos, os meios e a capacidade do país para os potenciar e garantir em permanência.
 
Como o tema, na ordem do dia, é a nova concepção do Estado e das suas funções e o novo desenho de Estado Social, questões cruciais que vão afectar o futuro do país, a começar pelo corte de quatro mil milhões de euros nas despesas do Estado, este tema não pode ser tratado de ânimo leve e, com um prazo tão curto imposto pela troika (até Fevereiro de 2013) para apresentar uma proposta, há sérios receios de que saia mais um aborto das mãos deste governo, castigando ainda mais os mesmos de sempre e deixando intacta a concentração da riqueza nas mãos das mesmas minorias privilegiadas de sempre.
 
Mas, este corte anunciado, que tem de ser feito com critério, já devia fazer parte dum plano mais global, estratégico, bem estudado e já preparado para ser executado por fases.
 
Esta medida apressada, apenas para cumprir objectivos de curto prazo, que garantam a qualquer preço a redução do défice das contas do Estado, arrisca-se a ser mais um desaire para o país, porque, como tudo indica, é uma medida isolada, não estando integrada em nenhum plano conhecido.
 
Mais uma vez, este governo, anda a reboque dos acontecimentos, não age, e reage apenas para tapar buracos, cada vez maiores, resultantes dos seus próprios erros, obstinações  e contradições.
 
E, receio bem que, nem a correcta avaliação dos meios e dos recursos e nem sequer a ideologia estejam presentes!
 
Mas, como sempre tenho defendido, tem de haver uma hierarquia no processo de tomada de decisão e não inverter os meios pelos fins.
 
Num processo desta responsabilidade e desta dimensão,  em que está em causa todo um modelo que, deve reconhecer-se, foi um fracasso, pelas razões atrás aduzidas, e por isso tem de ser reformado e reformulado, não podemos correr os mesmos riscos do passado e cometer os mesmos erros.
 
Tem de prevalecer o primado da metodologia, como primeira prioridade, porque só esta permite, com suficiente aproximação, fazer a avaliação quantitativa e qualitativa dos meios e dos recursos, formular a estratégia de longo prazo,  planificar as acções e definir o modelo, em cuja base assentará, a obtenção dos resultados ou objectivos esperados.
 
Só a partir daqui se poderá falar, se é que se pode falar assim de «ideologia», entendida esta como a forma de aplicar a política nos planos económico e social e em todas as áreas da sociedade.
 
Mas, qualquer que seja o plano considerado, a boa ideologia será sempre  aquela que procura atingir a sociedade no seu conjunto, a que pugna pelo equilíbrio, pela não discriminação, pelo não favorecimento de minorias, pela justiça, pela racionalidade, pela liberdade e pela equidade.
 



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