Pela passagem de mais um aniversário de uma revolução,
nunca são demais a reflexão, o balanço e a lição.
Ao ver e ouvir, ontem, a entrevista com Otelo Saraiva
de Carvalho, considerado o cérebro e o operacional da revolução, avivou-se-me a
memória de alguns pormenores, que ele, Otelo, tinha bem presentes, mas que o
tempo, desvanece na memória de muitos de nós.
Estive
lá, vivi os acontecimentos, conheço bem os prós e os contras, assisti às
reuniões da minha unidade militar, o antigo Regimento de Caçadores
Paraquedistas, que só foi chamada a intervir, uns dias depois.
Lembro-me de ter ficado retido na unidade, durante
três dias, em prevenção e de ter faltado a uma casamento de uma pessoa de
família chegada, que justamente se casava e se casou, nesse próprio dia 25 de Abril, do
já longínquo ano de 1974.
Foi
mais uma revolução de que o país foi protagonista, movida por ideais, como
todas as outras o foram no passado.
Mas,
como sempre acontece nas revoluções, em que se pretende substituir um estado
social considerado ultrapassado, por outro, há sempre desvios, há sempre
oportunismos, há sempre radicalismos, há sempre desmandos e há sempre tendência
a cair nos extremos.
Os protagonistas mais activos, mais politizados e
pretensamente mais esclarecidos (como aliás se dizia na época), arvoram-se em
iluminados, tomam as bandeiras da revolução e constituem-se na sua vanguarda avançada.
Assim
aconteceu em 1974.
A Aliança Povo-MFA instituída pela vanguarda da
revolução, de cariz socialista totalitário, pretendia instituir o socialismo em
Portugal.
Mas não se entenderam quanto ao tipo de socialismo mais
adequado ao povo português. Ouve sérias cisões e divisões na vanguarda revolucionária.
Uns queriam instituir o socialismo estalinista, à
maneira da antiga União Soviética. Fizeram campanhas de «dinamização cultural» por
todo o país, numa tentativa de abrir os olhos ao zé povinho, numa terra em que «quem tem um olho é rei».
Outros, a democracia popular à maneira da Albânia, uma
democracia directa baseada no poder popular e num socialismo de miséria.
Outros, os mais moderados, pretendiam uma via
socialista baseada na coexistência de uma economia privada, que serviria e
serviu, que nem uma luva, de vaca leiteira e de galinha dos ovos de ouro, para alimentar
o dito socialismo moderado.
Foi a via soarista, do nome do politico português Mário
Soares que a apadrinhou e que havia de ser adoptada pelo actual partido
socialista.
Houve golpes e contragolpes entre as várias facções,
tendo triunfado a via moderada do socialismo, o chamado socialismo democrático.
Uma das facções, a liderada por Otelo, perante a
derrota e não conformada, passa à clandestinidade e forma um movimento
revolucionário, a FUP – FP 25 de Abril que, por via da sublevação armada do
povo, ao qual foram distribuídas armas e de ataques terroristas, pretendia
impor o seu socialismo de miséria.
O movimento fracassou e Otelo foi condenado e preso.
Mário Soares, então Presidente da República, indultou-o e concedeu-lhe
amnistia.
Durante o processo revolucionário, O PREC, o país sofre
um rude golpe com a destruição da maior parte da sua infra-estrutura económica
de que foram precisos mais de vinte anos para a estabilizar.
O modelo de desenvolvimento soarista, imposto pelo
partido socialista e pelos partidários da social-democracia, arruinou definitivamente
o país, passou por três bancarrotas e hoje Portugal e o seu povo, vivem com
soberania limitada, sob coacção e ordens
de uma troika de credores a um governo feito fantoche.
O
modelo soarista, pretendendo ser mais papista que o Papa, secou a vaca leiteira
e matou a galinha dos ovos de ouro.
Portugal
é hoje um país em completa desagregação, económica, política, social e cultural,
o mais atrasado de toda a União Europeia, uma oligarquia de poderosos que se
aproveitou das fragilidades do regime, verdadeira nobreza medieval, o mais
desigual e excluindo de níveis de vida dignos, a maior parte da sua população.
Onde estão os ideais de Abril? Para que serviu a revolução? Apenas para ganharmos
liberdade e dizermos que o 25 de Abril é o dia da liberdade?
Foi muito pouco!
Somos mais habilitados e cultos? Vivemos melhor? Temos
níveis de bem estar dignos de ser vividos? De forma nenhuma.
O cartão de crédito e o Estado Social, assente em pés de barro, foram apenas os alimentos artificiais
de uma ilusão, que agora se desmoronou.
Diz-se que temos a geração mais qualificada de sempre.
É verdade.
Mas muita é aparente. Há muito papel carimbado com selo branco, mas muito dele nada mais representa do que isso mesmo, um bocado de papel e um canudo.
Mas muita é aparente. Há muito papel carimbado com selo branco, mas muito dele nada mais representa do que isso mesmo, um bocado de papel e um canudo.
Eu sei do que falo, porque dediquei mais de quinze
anos ao ensino universitário e constatei a santa ignorância dos nossos jovens
universitários, já muito mal preparados do nível anterior. De tal forma que
algumas universidades, tiveram de optar entre um ano propedêutico ou descer a
qualidade de ensino, para que os alunos chegassem ao fim das licenciaturas.
Não nos iludamos com as estatísticas!
A lição a tirar do 25 de Abril de 1974 é praticamente
a mesma que se tirou de outras revoluções, cada uma delas com o seu mote próprio
e as suas motivações.
Mas
em todas elas há uma elemento comum: todas descambam no aproveitamento e no
oportunismo de iluminados que, servindo-se do guião ideológico que melhor
assenta na mente do povo, impõe, curiosamente de forma democrática, o seu
modelo.
O nacional-socialismo de Hitler surgiu de forma
democrática, não nos esqueçamos e deu no
que deu.
A
revolução de 25 de Abril de 1974, acabou por ser um misto de utopia e
oportunidade perdida. Utopia inicial dos revolucionários, optando por modelos
já gastos e com péssimas provas dadas e que reduziu a escombros as principais
infra-estruturas económicas herdadas do salazarismo, mas
essencialmente foi uma oportunidade perdida, pela falta de realismo no modelo
de desenvolvimento seguido.
A
grande lição a tirar é que, como dizia, Friedrich Hegel, «O QUE A HISTÓRIA
ENSINA, É QUE OS GOVERNOS E AS PESSOAS
NUNCA APRENDEM COM A HISTÓRIA»!