Lembro-me de, já há alguns meses, alguém que se intitulava
«trabalhador», ter dito, em estilo de comentário a qualquer coisa que escrevi, que apenas os trabalhadores criam riqueza.
Não me surpreendeu tal afirmação.
Ela é o resultado da falta de informação, da falta de conhecimento
sobre a matéria e também, provavelmente, o resultado de formação sindical
inconsistente, enviesada ou mesmo visando objectivos politicamente
convenientes.
Mas esta afirmação, encerra também uma outra realidade.
É a que se relaciona com o conceito de trabalhador.
Se, trabalhador é todo aquele que trabalha, então todo aquele que
exerce uma função seja ela qual for, numa qualquer Instituição, ou mesmo a
título individual, são trabalhadores.
São por isso trabalhadores não apenas os que excutam as tarefas
mais elementares de um determinado processo organizacional (industrial,
comercial, administrativo, financeiro), como aqueles que, situando-se ao nível
intermédio ou de gestão, exercem a função de supervisores, directores,
controladores.
Mas, diria ainda mais. Se trabalhador é todo aquele que exerce uma
função, também aqueles que, situando-se ao nível do vértice estratégico das
organizações, os que exercem as funções de administração (por exemplo o Presidente
de um Conselho de Administração e os membros deste Conselho), também são
trabalhadores.
E, iria ainda mais longe. Os que, sendo proprietários (sócios ou
accionistas) de uma organização e, exercem uma função (e muitos exercem-na), a
qualquer nível, também são trabalhadores, também concorrem com o seu trabalho.
Mas, a questão que me leva a esta reflexão é que, o conceito de
trabalhador tem vindo a ser associado, pela esquerda política, ao conceito
marxista do século XIX, dos primórdios da Revolução Industrial, num contexto,
completamente diferente daquele que hoje se vive nas organizações.
No tempo de MARX, o operário fabril, pouco mais era que o servo
medieval, descendente do escravo, que veio dos campos feudais, em busca de
melhores condições de vida.
Sendo as estruturas organizacionais pouco complexas, a produção
era feita à custa de mão-de-obra intensiva, sendo praticamente os operários
fabris os únicos que executavam as tarefas (os chamados trabalhadores) e apenas
enquadrados por capatazes que controlavam esse trabalho.
Mas, mesmo nesse tempo, já as teorias da administração de Taylor e
Fayol, nos falavam de uma função muito importante nas organizações, chamada
«Função Administrativa» o que, já nessa altura indicava, claramente, que também
havia trabalhadores a exercer essa função e não apenas os executantes das
tarefas fabris.
Portanto, trabalhador é todo o funcionário que, numa organização,
contribui com o seu trabalho, a qualquer nível, com vista a atingir um
determinado objectivo (produção de bens ou serviços).
Mas, voltemos à velha questão de quem produz a riqueza.
Será apenas o funcionário, o trabalhador?
Imaginemos que alguém, com um pequeno lote de terreno, pretendia
utilizá-lo para produzir batatas.
Seria possível, a esse alguém, produzir batatas, apenas utilizando
o seu corpo, especificamente as suas mãos? Fornecendo apenas o seu próprio
trabalho? Obviamente que não. Se o tentasse o mínimo que lhe poderia acontecer
era ir parar a um Hospital.
Não podendo utilizar apenas as suas mãos, faltará qualquer coisa
para que ele possa produzir as batatas.
O que falta é aquilo que se chama o Capital, não no sentido de
dinheiro, mas no sentido de capital económico ou produtivo, no fundo as
ferramentas, os utensílios, as matérias-primas, os adubos e o próprio terreno,
onde o dinheiro, que alguém disponibilizou (até pode ser o próprio trabalhador),
foi aplicado.
Só este Capital Económico, juntamente com o Trabalho, permitem
criar riqueza e não apenas um deste
factores produtivos isoladamente.
No caso concreto, no mínimo, com uma enxada (que alguém teve de
comprar) e a matéria–prima (a batata-semente) juntamente com a força muscular
dada pelo trabalhador, seria possível produzir as batatas.
Este exemplo muito simples, é bem elucidativo, da forma como
confundimos o conceito de Capital e de Capitalismo, julgando-se erradamente,
que apenas o factor Trabalho produz riqueza.
Vem isto a propósito dos mitos, dos preconceitos que muitas vezes
se criam, por errada informação ou errada formação, acerca do Capitalismo.
Em qualquer economia, mesmo na situação extrema de totalitarismo colectivista,
há sempre capitalismo, pelas simples razão de que, para se produzir seja o que
for, tem de haver concorrência de pelo menos dois factores produtivos: O
Capital e o Trabalho.
Sabendo-se à partida, quem fornece o Trabalho (em princípio toda a
população em idade activa), coloca-se a questão de saber quem fornece o
Capital, ou seja quem dispõe da capacidade de aplicar o seu dinheiro em bens imóveis e de equipamento (edifícios,
terrenos, máquinas, ferramentas, viaturas, computadores, mobiliário, etc.) e
ainda disponha de capacidade de gestão.
Nas economias totalmente colectivizadas, esse Capital é fornecido pelo
Estado. É o chamado Capitalismo de Estado.
Nas economias mistas (sector público e privado) sãos os cidadãos
(inclusive os trabalhadores que disponham de poupanças) e o próprio Estado
através da receita dos impostos.
É o Capitalismo Misto.
Conclui-se, portanto que, em qualquer economia, há sempre Capitalismo, tem de haver sempre Capitalismo.
O problema de fundo não é tanto, o fantasma do Capitalismo e do
seu mau ou abusivo uso (a Regulação do Estado visa evitá-lo), mas a forma como
a riqueza produzida, resultante da intervenção do Capital e do Trabalho, é distribuída.
É este o problema fundamental que, até agora, mau grado as teorias
económicas, desde a «mão invisível de Adam Smith», do liberalismo puro, até aos
modernos modelos económicos e sociais, ainda não se conseguiu resolver, de modo
aceitável.
É que, em todos eles, existe a intervenção do Homem que, como
todos os outros animais, age de acordo com o instinto de sobrevivência mas, que
ele Homem, por ter uma inteligência acima da média, muitas vezes perverte,
degenerando em oportunismo, inviabilizando e frustrando a sua aplicação de
forma justa e equilibrada.
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